Luanda - O poder militar angolano permanece marcado por dependência externa, obsolescência tecnológica e fragilidades estruturais, contrastando de forma quase constrangedora com a modernização crescente de vários exércitos africanos. Como bem sublinha Lando Simão Miguel, “as Forças Armadas Angolanas permanecem presas a modelos estratégicos de 1975, revelando dificuldades em acompanhar a inovação global, apesar do investimento significativo no sector da defesa”. A dependência quase total de equipamento importado, maioritariamente de origem soviética e já claramente ultrapassado, limita a autonomia estratégica do país e reduz drasticamente a sua capacidade de projecção regional.
Fonte: Club-k.net
No plano humano e doutrinário, Angola insiste na conscrição obrigatória, em treinos básicos padronizados e numa dependência estrutural de instrutores estrangeiros, enquanto outros países africanos avançam para forças profissionais, tecnologicamente capacitadas e orientadas para a guerra moderna, incluindo ciberdefesa, inteligência artificial e operações espaciais. A modernização do equipamento militar é lenta, desigual e desarticulada, com uma frota naval reduzida, dificuldades logísticas persistentes e uma soberania que começa nos discursos, mas tropeça logo nas botas, todas elas importadas. Num país que se diz estratégico, não se produz localmente nem uniforme, nem calçado militar, nem equipamento básico, quanto mais sistemas tecnológicos avançados. A soberania nacional, ao que parece, continua embalada em contentores estrangeiros.
Há ainda um paradoxo ideológico difícil de ignorar. Angola continua a operar sob ideologias militares importadas, como se depois de mais de 30 anos de guerra real e contínua não tivesse produzido uma doutrina militar própria. Persistir numa matriz exclusivamente herdada, quando o país foi simultaneamente influenciado por escolas russa, cubana, chinesa, vietnamita, norte-americana e outras, não é cooperação estratégica, é preguiça doutrinária institucionalizada. Angola não foi apenas aluna, foi laboratório vivo de guerra convencional, irregular, logística em ambientes hostis e adaptação estratégica. Importar ideologia militar hoje não é modernizar, é abdicar de pensar. A maturidade estratégica exige sistematizar essa experiência própria, absorver influências externas de forma crítica e construir uma ideologia militar angolana, moderna, híbrida e pragmática, em vez de continuar a vestir fardas doutrinárias alheias que já nem servem aos países que as exportaram.
A base de qualquer defesa moderna é o conhecimento, mas Angola continua a tratar a educação como um sector social e não como infra-estrutura estratégica de segurança nacional. Os avanços tecnológicos dependem directamente da qualidade do investimento na educação, que é a verdadeira fonte de recrutamento dos quadros operativos do sistema de Defesa e Segurança. O recrutamento deve ser direccionado, articulado e complementar ao sistema de educação formal e civil, e não um exercício aleatório de captura humana nas ruas. A guerra contemporânea não se vence com músculos sem cérebro. Manter a prática do recrutamento sem critério escolar é garantir um exército numeroso, mas estrategicamente frágil.
Num continente onde potências emergentes como Egipto, África do Sul, Etiópia e Nigéria investem agressivamente na industrialização militar, profissionalização das tropas e autonomia tecnológica, Angola perde competitividade e permanece limitada a uma função essencialmente interna e defensiva. Torna-se, assim, evidente a necessidade de reformas profundas, industrialização dos equipamentos militares e de segurança, profissionalização efectiva, ruptura com práticas arcaicas e uma estratégia de modernização coerente, sob pena de as FAA continuarem a ser respeitadas apenas pela sua história passada, enquanto o futuro passa em marcha acelerada… fabricado noutros países.