Luanda - David Boio tem razão. E tem-na não por intuição política, mas porque os dados confirmam aquilo que o marketing político ensina há décadas: todo o produto tem um ciclo de vida, inclusive os produtos eleitorais embalados em esperança, moralidade e promessa de mudança.
Fonte: Club-k.net
Os números são claros e, ironicamente, implacáveis. Segundo dados do Afrobarometer, a intenção de voto na UNITA passou de 8 por cento em 2022 para cerca de 14 por cento em 2024. À primeira vista, parece crescimento. Contudo, para quem compreende marketing político, este dado é ambíguo: crescimento lento após uma eleição altamente polarizada indica saturação do produto, não expansão acelerada.
Em 2022, Adalberto Costa Júnior representou o auge do ciclo. O “produto ACJr” atingiu a sua fase de maturação máxima, com grande visibilidade, forte identificação simbólica, mobilização juvenil e um eleitorado profundamente cansado de quase cinquenta anos de governação do MPLA. O resultado foi histórico, mas não suficientemente disruptivo para provocar ruptura. E o mercado político angolano é implacável com produtos que prometem muito e depois apenas resistem.
Dois anos depois, os mesmos dados indicam que o crescimento existe, sim, mas já não é exponencial, é incremental. No marketing político, crescimento incremental em contexto de crise profunda do incumbente não é vitória; é sinal de alerta.
Enquanto a UNITA mantém o mesmo rosto, o mesmo discurso central e a mesma estratégia de posicionamento, o MPLA, dado como politicamente esgotado em inúmeras análises académicas, continua confortável dentro da sua zona de conforto eleitoral, conceito amplamente descrito por Schedler e Simpser. As pesquisas demonstram que, apesar do desgaste, o MPLA ainda conserva uma base suficiente para ajustar, manipular e sobreviver.
Aqui emerge a ironia mordaz da realidade política angolana: o partido que governa há quase meio século ainda dispõe de margem estratégica, enquanto o partido que nunca governou começa a revelar sinais de previsibilidade eleitoral.
Os dados geracionais reforçam a leitura de David Boio. A chamada Geração da Paz tende a inclinar-se mais para a UNITA, mas os próprios estudos qualitativos indicam que este voto é contingente, experimental e condicionado a resultados futuros. Não se trata de fidelidade política, mas de teste de alternativa. E produtos em fase de teste precisam de evolução rápida ou acabam descartados.
Já a Geração da Guerra e a Geração da Independência, embora cada vez mais críticas em relação ao MPLA, não migraram de forma massiva para a UNITA. As pesquisas revelam hesitação, voto estratégico e prudência política. Não por convicção ideológica no MPLA, mas por ausência de novidade suficientemente convincente do lado opositor para justificar o risco psicológico da alternância.
É aqui que David Boio toca no ponto mais sensível. O elemento surpresa já não está com a UNITA. Está com o MPLA. Não por virtude democrática, mas por engenharia política. O MPLA sabe, como sempre soube, que quando a marca está desgastada, muda-se o rosto, não o sistema. Um novo candidato, cuidadosamente apresentado como técnico, reformista ou moderado, pode neutralizar parte significativa do crescimento lento da UNITA, mesmo mantendo intactas as estruturas fundamentais de poder.
As pesquisas não apontam para um colapso do MPLA. Indicam antes um declínio controlado. E revelam, simultaneamente, uma UNITA que cresce, mas sem romper o tecto eleitoral. No marketing político, isto significa produto sólido, porém previsível.
No final, a ironia mordaz maior reside nisto: enquanto a UNITA centra o debate na fraude, na legitimidade e na ética, temas absolutamente legítimos, o MPLA prepara aquilo que historicamente domina com mestria, o reposicionamento do produto antes que o eleitor decida mudar definitivamente de marca.
Em Angola, os dados mostram que o eleitor não é ingénuo, mas também não é romântico. A mudança ocorre quando se sente impacto real, não apenas quando se reconhece razão moral.E se 2027 vier a ser decidido não apenas pela manipulação, mas pela fadiga do consumidor político, David Boio poderá afirmar, com serenidade analítica, que os números já haviam avisado.