Luanda - Na espiral da crise socioeconômica angolana, o preço dos combustíveis tornou-se um estopim recorrente. E quando o fogo alastra, a resposta das autoridades não é água — é gasolina, bastões e munição real. No país onde os protestos viraram crime e a fome virou rotina, 2025 começou como um déjà-vu sufocante. Mais uma vez, o governo aumentou os preços dos combustíveis, mais uma vez o povo protestou, e mais uma vez a repressão respondeu.
Fonte: Club-k.net
Voltemos no tempo. Em setembro de 2015, quando João Lourenço ainda era apenas um figurante no teatro do poder, o aumento dos combustíveis sob José Eduardo dos Santos levou os taxistas à paralisação — uma greve histórica que paralisou cidades inteiras. O regime percebeu o poder daquele acto e, com a perícia de quem conhece a arte da divisão, fragmentou a associação dos taxistas em grupos e placas para neutralizar futuras ameaças.
Mas dividir não foi o suficiente. Em 2022, mesmo sob forte vigilância e coação, os taxistas voltaram a ameaçar o status quo. A revolta popular explodiu em vandalismo — não como escolha, mas como último recurso. A resposta de João Lourenço foi endurecer: criou leis contra crimes de vandalismo, não para proteger o bem público, mas para calar a indignação colectiva.
Em 2023, o regime já havia amansado muitos dos taxistas — comprando uns, cooptando outros. Mas a fome e a humilhação são forças indomáveis. Sobravam os mototaxistas, que ainda conservavam um pouco de fôlego e coragem. Quando o governo mexeu de novo nos combustíveis, eles reagiram. O resultado? Sangue nas ruas do Huambo. Oito mortos. Oito filhos de Angola assassinados pelo próprio Estado que deveria protegê-los. Uma tragédia que, em qualquer país democrático, derrubaria ministros. Em Angola, apenas endureceu a repressão.
Em 2024, o medo venceu a rua. Silêncio. Mas em 2025, o governo decidiu abusar da calmaria. Subiu, outra vez, o preço dos combustíveis — como quem provoca um animal já ferido. E o povo voltou. Voltou com as poucas forças que lhe restam. Voltou em greve, em protesto, em indignação. E junto veio o caos. Lojas invadidas, bens públicos destruídos, motins espontâneos que não se explicam com estatísticas. São vozes sem microfone, são estômagos sem pão. Não defendemos a destruição. Mas entendemos a dor.
O Executivo, ao invés de diálogo, preferiu a lógica da guerra. Investiu milhões em blindados, armas e gás lacrimogéneo. Não comprou ambulâncias, não comprou hospitais. Mas comprou tudo o que serve para calar. E assim se arma para uma guerra contra o seu próprio povo. Isso não é acaso. É método. É estratégia.
Mais uma vez, e como sempre, buscarão imputar a culpa à UNITA. Como se a fome tivesse filiação partidária. Como se o desespero tivesse cor política. Mas o povo já não é tolo. O povo não é cego. O povo não é mudo. Quem está surdo é o governo do MPLA, afogado no eco da sua própria arrogância.
Chegou a hora de respeitar o povo. Não com balas. Mas com pão. Não com mentiras. Mas com reformas. Não com propaganda. Mas com escuta.
Se o governo insiste em tratar o povo como inimigo, não se espante se o povo passar a tratar o governo como opressor. O povo cansou. E, quando o povo se levanta, nem os blindados salvam um regime que perdeu a alma.
Por Hitler Samussuku